terça-feira, dezembro 08, 2009

A Última Donzela e a Cartola

O cigarro de Fernando havia se consumido, chegando ao filtro branco adornado por uma linha prateada e pelo símbolo simétrico do Lucky Strike. Mas ele não imaginava este pequeno fato isolado no universo de fatos que orbitavam pelo bar. Risadas, gargalhadas histéricas, pequenos murmúrios e falácias, muita falácias entravam em simbiose no denso e escurecido ar do recinto. Catarina embriagada, vez em outra se achegava a Fernando e o abraçava, beijando-o no pescoço. Era um pequeno mimo que significava sua intenção em ficar com ele naquela noite. E Fernando sabia do costume de sua amiga, afinal, foram meses a fio beijando aqueles lábios, porém sem nunca fazerem sexo. Catarina era magra, no significado exato da magreza, mas mantinha um charme incrível e uma inconseqüência que atraía Fernando aos seus braços. Era uma inveterada fã do rock, e ele também, o que os fazia atravessarem horas em conversas sobre o assunto. Os dois sempre que possível andavam juntos, vestidos de maneira perecida, ostentando bandas de seus gostos em suas camisetas. As pessoas achavam que eram namorados, e não era só pelo fato de costumarem ficar um com o outro, mas também pela incrível compatibilidade de suas almas.

- Vamos lá, porra! Mais vinho! – gritou Fernando em tom alcoolizado.
- Vamos fazer vaquinha, todo mundo dá um real, dois reais e tá feito! – alguém agilizava a contribuição.

As mãos de algum pobre diabo disposto a arrecadar dinheiro, se formavam em concha e abordava um a um, procurando captar o máximo de recursos. O fim das doações havia chegado ao fim e a mixaria de quatro reais e quarenta e cinco centavos havia sido contada. Isso dava para duas garrafas de vinho, um vinho tão ruim que se aproximava do vinagre. Um verdadeiro suicídio, lento e devastador. Aquela era a sexta vez que o grupo entrava no mercado para comprar vinho. Novamente duas garrafas. Todas as vezes que o grupo entrou para comprar a bebida, sempre levavam ao caixa duas garrafas de um litro. Só que dessa vez o grupo cambaleava em meios às gôndolas da seção gelada de frios. Entraram à direita na seção de enlatados que lhes dava a distância de vinte passos da seção de bebidas. Parecia pouco, mas os passos eram calculados e lentos, para que não houvesse uma queda coletiva e constrangedora. Finalmente chegaram à seção cheia de garrafas, ataviada com as mais belas bebidas que o mundo pode comportar. Fernando e Catarina andavam de braços dados, rindo e procurando em meio aos giros da visão, as garrafas da perdição. E a perdição estava escassa, afinal, sobraram exatamente duas garrafas. Surrupiaram rapidamente as garrafas e continuaram a longa jornada até o caixa rápido. O casal já havia passado por porres bem piores que esse, e administravam a alegria gerada com generosidade, irradiando sorrisos, acenos, gritos eufóricos. Eles encantavam a todos no lugar e todos encantavam aos dois. Após o grupo beber de forma ensandecida cada gota do vinho amargo, cada um começou a decidir seu destino na noite.

- Ah! Hoje eu vou ao pagode! – alguém cheio de entusiasmo exibia sua pretensão.
- Credo! Pagode! Aff! – outro alguém protestava
- Fernando, vâmo pra Augusta! – sugeriu Catarina com sorriso devasso.
- Ah! Não sei, o que acha Marlon? – Fernando questionou olhando para seu amigo.
- Vâmo, porra! Tá afim? Então vâmo, porra! – gritou Marlon esfregando uma mão na outra.
- Cecília, você acompanha o Marlon? – perguntou Catarina.
- Claro! Vamos pra lá... – aceitou a amiga do casal.

Marlon conhecia Fernando há quase um ano, e o pouco tempo não os impediu de cultivarem uma amizade baseada em confissões secretas, bebedeiras após o expediente e extensas conversas em meio ao trabalho. Cecília era amiga de Catarina, um tanto conservadora (virgem) e estava tendo algo com Marlon. Provavelmente alguns beijos acalorados.

O grupo se dispersou em breve despedida. Em poucos minutos o quarteto estava num ônibus rumo à região da avenida Paulista. Pode parecer que estavam conversando amistosamente, mas o álcool havia subido com maior intensidade. Marlon começou seu repertório de baixarias em público ao cantar o hino do Grêmio de Porto Alegre em meio a trabalhadores cansados da jornada pesada das obras e fábricas. Alguns olhavam de forma irritada, porém a maioria ignorava os versos berrados do tricolor gaúcho. Os trabalhadores apenas queriam um descanso, e a fadiga era tanta que o vidro da janela servia como confortável travesseiro no sono que aliviava a longa viagem até suas casas. Alguns roncavam, embaçando os vidros com seus bafos enquanto outros permaneciam com suas cabeças apoiadas no encosto duro dos assentos. O ônibus balançava e Fernando, em pé, já duvidava de sua capacidade em permanecer ereto e firme. Catarina ria muito enquanto Cecília observava seus amigos com um sorriso de quem estava perfeitamente consciente de tudo que ocorria. Finalmente o ônibus chegou ao ponto e os quatro desceram aos trancos e barrancos, sem a mínima noção do que estavam fazendo. E o álcool permanecia implacável na missão de entorpecê-los cada vez mais. A vista girava cada vez mais rápida e exceto Cecília, todos se arrastavam na subida até a avenida Paulista. Um verdadeiro sacrifício em meio às arvores que balançavam sob a força dos ventos que se intensificavam a cada minuto. Catarina compreendeu que Fernando já não tinha mais controle sobre suas pernas, o que a fez reunir suas últimas percepções e reflexos sóbrios e guiar o amigo até o bar na Augusta. O céu flertava com uma chuva rápida, mas tudo ficou na ameaça. Os quatros envolveram seus braços nos ombros de quem estava ao lado e caminharam como quatro camaradas bêbados, porém sabendo que daquele jeito era difícil cair. Caminharam pela maldita entrada do Parque Trianon e atravessaram até o MASP. Prosseguiram em meio a risadas e pequenas brincadeiras até chegarem à esquina com a rua Augusta. Marlon e Cecília conseguiram dobrar à direita tranquilamente, mas Fernando havia perdido o controle do lado direito do corpo e andava apenas para a esquerda, em direção à rua movimentada.

- Fernando! Porra, o que você está fazendo?! – gritou Catarina enquanto segurava o amigo pelo cotovelo.
- Eu não sei... massss não consigo virar para a direita... – respondeu Fernando totalmente alterado e com voz arrastada.
- Puta merda, era só o que faltava!
- Me puxa, Catarina! Sério!
- Caralho! Caralho!

Catarina empurrou Fernando para a calçada e continuou descendo a Augusta guiando o companheiro pelos ombros. Marlon acompanhava a cena às risadas junto de Cecília que contemplava o desastre com olhos de criança, ou seja, abismada. Com muitas dificuldades, os quatro chegaram ao bar Vitrine. Encontraram uma mesa vazia e repousaram por alguns minutos.

- Marlon, vem comigo no banheiro! – disse Fernando se levantando bruscamente e se dirigindo ao banheiro, tropeçando nas cadeiras.

Fernando chegou com velocidade descontrolada ao banheiro e se dirigiu à cabine vazia. Pôs-se de pé, diante da privada e com dificuldade abriu o zíper de sua calça. Enquanto o mijo descia, ele vacilava em sua posição e ria ao ver o reflexo de seu pau no botão metálico da descarga. Logo que terminou o mijo, correu para a pia e vomitou rios de vinho. O vômito era de uma roxo vivo, e inundava uma das pias e o chão do banheiro. Um francês se aproximou de Fernando abordando-o com sotaque:

- Vai maconha aí, amigo?
- Vai se foderrrr... – cuspiu algumas ofensas e se afastou.

Marlon encarava o francês com olhar fulminante de raiva e ao mesmo tempo guiava seu sofrido amigo à mesa. Catarina preocupada ensaiou um cafuné no cabelo liso de Fernando, mas logo se levantou e, chamando Cecília, foi ao banheiro. Marlon acendeu um cigarro e permaneceu em sentinela, vigiando o amigo nocauteado pelo vinho.

- Puta que o pariu, hein Fernando?! Hoje você bebeu! – Marlon reclamou em tom irônico.
- É, pode crer, mano. To foddddido...

As garotas chegaram à mesa e ficaram fumando e conversando alguns assuntos sem sentido, enquanto Marlon alternava seu olhar entre o amigo e o ambiente. Fernando permanecia com a cabeça reclinada na mesa, tentando sem sucesso falar alguma coisa, tentando demonstrar alguma dignidade. Alguns marmanjos tentavam se aproximar de Catarina.

- Ei! Vem sentar aqui com a gente, seu namorado abandonou você! – algum rapaz disse.
- Ele não é meu namorado, é meu amigo. Jamais deixaria ele aqui. – disse Catarina virando as costas para os rapazes.

O rock tocava incessantemente e não havia idéias. Fernando geralmente proporia algo, mas lá estava ele, inerte aos estímulos da noite.

- A gente podia ir pra casa da Cecília e dormir lá! O que acha? – sugeriu Catarina.
- Pode ser! Mas como vamos chegar lá com o Fernando desse jeito? – questionou Marlon.
- A gente pega um táxi! Vamos fechar um preço com ele e vamos pra lá! – Catarina solucionava o impasse.
- Onde diabos fica sua casa, Cecília? – perguntou Fernando com a cabeça na mesa.
- Em Pinheiros, perto do largo.

Marlon e Catarina saíram do bar a fim de pegar um táxi. Ao combinarem o preço, correram ao bar para chamar Cecília e Fernando. Ele se levantou com dificuldade e foi em passos lentos até o táxi. Sentou no banco de passageiro, pois segundo Marlon, “se ele quisesse vomitar, ficava mais fácil de colocar a cara para fora”. E ele tinha razão: Fernando vomitou por muitas vezes durante o trajeto até Pinheiros. Após sucessivos vômitos, Fernando já estava mais lúcido e conversava sem problemas com o motorista. Mas ele nem imaginava o motivo de estarem dentro do táxi e muito menos imaginava quem iria pagar pela corrida.

Chegaram ao prédio de Cecília, pagaram o táxi e se dirigiram vagarosamente à porta. O prédio embora fosse antigo, era confortável, com um lobby bem espaçoso. Ao chegarem no apartamento, Fernando foi ao banheiro, abriu os botões da camisa e se contemplou no espelho. Deu um sorriso de malícia e se abaixou para cagar.

- Que se foda se é casa dos outros. Vou cagar. – pensou Fernando.

Marlon e Cecília se aconchegavam em um colchão que ficava ao lado de um vaso que exibia uma vívida planta de maconha, que devia ter pelo menos um metro e vinte de altura. Era realmente engraçado ver a maconha em seu estado bruto. Marlon e Fernando se sentaram ao lado do vaso e ficaram tocando nas plantas, rindo. Fernando arrancou uma folha e colocou no bolso da camisa.

- Vem logo, Fê! – Catarina chamou com voz manhosa.
- Peraê, peraê!

Após o encanto da maconha ter acabado, os machos se aninharam com suas fêmeas. A luz apagada era o sinal de que havia liberdade para tudo naquela noite. Marlon havia abaixado as calças de Cecília e enfiado a mão dentro de sua calcinha. Ele brincava euforicamente com os dedos dentro de sua boceta enquanto alguns suspiros saíam de sua boca. Fernando ouvia a ação do casal ao lado e dava risadas, enquanto se concentrava em chupar caprichosamente os mamilos de Catarina. Decidiu avançar na ousadia e enfiou os dedos na boceta da amiga, cutucando seu clitóris. O pau estava duro como rocha, pois sua companheira gemia em seu ouvido sem parar, provocando-lhe arrepios generalizados pelo corpo. A bebedeira não havia surtido efeito negativo e a libido estava a todo vapor. Fernando pincelava o pau na boceta de Catarina que se derretia em longos suspiros. Ele conseguia sentir que algumas gotas de porra já ensaiavam a saída. Ao mesmo tempo, alguns gemidos eram ouvidos por parte de Cecília, que desfalecia como gelo no calor dos toques de Marlon. Em alguns momentos, os dois amigos se entreolhavam sob a luz da lua que cortava a sala e riam um do outro. Porém Fernando não estava totalmente são e como de costume, ficou romântico.

- Catarina, eu te amo. Eu tenho certeza que vamos namorar um dia! Eu amo você, eu amo ficar com você, amo tudo em você! – Fernando sussurrava com sentimentos exaltados.
- Ai... Ah! Não pára! Não pára! – Catarina estava surda para as declarações inebriantes do amigo e só se concentrava no prazer.

Marlon ria do estilo cafajeste com o qual Fernando se dirigia à amiga. Marlon enfim sacou sua pica e enfiou profundamente dentro de Cecília, que enfim experimentou a textura de um membro masculino arrancar sem piedade sua pureza. A última donzela caía naquele colchão ao lado de um vaso de maconha. Ela dava pequenos gritos enquanto o olhar de Marlon era pernicioso, destilando luxúria que se misturava ao suor dos dois corpos. Enquanto um momento marcante surgia para Cecília, Catarina estava de quatro chupando com fervor o pau de Fernando e ele continuava com sua ladainha romântica dizendo “eu te amo”, “quero você pra sempre” e todas aquelas promessas baseadas em gozo de boceta. E quando Catarina estava sentada no pau de seu companheiro, o mesmo gozou em frenético coito, tanto foi o prazer que Fernando mordia o ombro da amiga, até que caiu para trás, sem reação, entregue ao relaxamento muscular. Marlon terminava seu trabalho, montado em Cecília, puxando seus cabelos. A ex-virgem mostrava-se empolgada com a nova experiência. Marlon caiu mórbido, com a camisinha envolta em seu pau, cheia de porra, cheia de desejo. As garotas foram ao banheiro se lavar e confabular sobre aquilo que já sabiam. Fernando e Marlon se livraram dos preservativos e permaneceram nus, deitados esperando suas garotas.

Após minutos de conversa, o cansaço se apoderou de suas mentes, e não havia mais espaço para vida inteligente naquela sala. Dormiram até as nove da manhã. Fernando acordou com uma dor de cabeça monumental, pensando se tratar de um derrame cerebral, mas logo lembrou que o vinho era uma porcaria e que sempre depois disso, a ressaca chegava. Marlon acordou com a mesma dor de cabeça e logo levantou para se vestir. Os dois se despediram de suas sonolentas mulheres e ganharam a rua que terminava no largo de Pinheiros. Compraram um maço de cigarros e tomaram um café sentados num bar, cada um com olhar fixo em algo. As lembranças chegavam aos poucos e risadas eram lançadas na xícara de um café fraco e adoçado. Marlon não parava de cheirar o seu dedo médio.

- Fernando, cheira aqui! – levou seu dedo ao nariz do amigo.
- PUTA QUE PARIU, Marlon! Vai se foder! – Fernando constatou que era cheiro de boceta seca, que havia permanecido no dedo que bolinara a vagina de Cecília.

Logo depois, se dirigiram ao ponto de ônibus na avenida Rebouças, sob uma fina garoa. Ficaram por uma hora esperando os ônibus esvaziarem, mas foi em vão.

- Vamos subir a pé. Que se foda! – sugeriu Fernando.
- Vai, vâmo logo.

À medida que subiam, deliravam em assuntos triviais e de pouca importância. Falavam apenas para ficarem animados o suficiente para terminarem o trajeto até a avenida Paulista. Era uma boa caminhada.

- Sabe Fernando, quando eu for rico, quero andar de bengala, e com aquelas cartolas grandes, sabe?
- Hahaha! Sei sim, seria demais. Olhar esnobe, com aquela cartola. Puta, seria foda!